Ela acorda muitos dias com as pernas e os braços e o pescoço envoltos em gesso. O gesso que colocam às pessoas e aos animais quando partem uma perna, um braço, um tornozelo ou um pé. É uma sensação estranha, desconfortável – diz-me ela. Mas eu não a entendo. Por mais que queira não consigo imaginar como é acordar com o corpo como se vê nos filmes cómicos: um corpo estendido sobre uma cama de hospital, um corpo envolto em gesso, todo partido, apenas os olhinhos à mostra e a única e extraodinária capacidade de beber por uma palhinha…!
O mundo dá muitas voltas – dizem –, mas quando ela está assim, não há volta a dar. A solução é ficar ali, parada. E esperar que o mundo dê as suas voltas. Há pelo menos a compensação de que o mundo lá fora avança e dá voltas – como se diz. Ou, pelo menos fica o desespero de saber que o mundo lá fora avança e ela nada pode fazer ali parada envolta em gesso até ao pescoço e a beber café por uma palhinha.
2 comentários:
Ao ler o post imediatamente me veio à ideia, o quadro da Frida Kahlo, onde no lugar da espinha dorsal está uma coluna grega que se partiu em vários sítios.
Também Frida Kahlo foi uma sofredora, mas uma grande lutadora como tu ...
Uma imagem fortíssima, tão real quanto incompreendida. Gostei imenso, Rita
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